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sábado, 11 de dezembro de 2010

Condenado

Hoje é meu aniversário de 57 anos; mês que vem vou morrer. Na verdade serei morto. Irônico: a sociedade mata para mostrar que não devemos matar.

Estou cansado de ficar preso e logo receberei minha liberdade suprema. Morto ficarei inatingível. Todas as ofensas e críticas - e os impostos! - não mais me alcançarão. Poderão me desenterrar apenas para urinar sobre meu cadáver pútrido. Que percam seu tempo e sua paz. Não fará a menor diferença.

Morte planejada. Nós, condenados com hora marcada pela sociedade civilizada (aquela que mata para mostrar que é errado matar) somos, de certo modo, privilegiados em relação aos condenados pela natureza (ou por Deus, como queira). Não vamos atrapalhar os planos de ninguém. Tivemos um bom tempo para resolvermos nossas pendências. Não faltaremos a nenhum casamento ou formatura por termos morrido violentamente em um acidente de carro em uma ensolarada tarde de sábado enquanto íamos felizes para festa. Que decepção morrer em um dia assim. "Logo hoje!"

Há outra ironia. Minha vítima morreu em dor e agonia, suja de medo (mereceu, na minha opinião). Eu morrerei tranquilamente. Sem dor, sem sofrimento, como se adormecesse após um longo dia de trabalho e preocupações. Algumas injeções e estará feito. Haverá até um padre para encomendar a minha alma. E também uma ótima última refeição! Uma morte digna como poucas; com um exército cuidando para que assim seja.

57 anos de vida... Suspeito que seja mais tempo do que vive a maioria das pessoas, mesmos as mais louváveis.

Crianças, jovens, velhos, pobres, ricos, honestos, pilantras, famosos, anônimos, corajosos, covardes... Não fiquem tão felizes por não estarem em meu lugar. Todos estão condenados, de um jeito ou de outro. Você sabe que é questão de tempo, o que você não sabe é quando, onde e como. Talvez seja tão terrível quanto o foi para as vítimas dos maníacos de Dnepropetrovsk.

Sou um homem de sorte, afinal.

6 comentários:

  1. Gostei do blog, e a postagem de estreia faz pensar.

    Não escondo minha condenação à pena de morte e à irracionalidade de dar a uma instituição falha e corruptível como o Estado o poder sobre a vida e a morte.

    Queremos punir tanta gente... mas que tipo de punição é morrer? É como ir dormir e não acordar mais, nem sonhar. Eu não me sentiria punido morrendo. Eu não sentiria nada. Eu não seria mais.

    Abraço!

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  2. Tinha que ser tu o primeiro, ó mais pensante dos seres. Tua primazia é uma honra ;)

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  3. Show!!! Gostei muito da primeira postagem e imagino que venha coisas bem interessantes por aí!!! Vou continuar seguindo... Parabens!

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  4. Texto muito show, sabe usar bem as palavras, tem um bom vocabulário,Parabéns! seguindo....

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